sábado, 6 de agosto de 2011

A ORIGEM DA JUREMA DO ACAIS


A ORIGEM DA JUREMA DO ACAIS
Nossa origem remonta a formação do município de Alhandra/PB com o trabalho da Mestra Maria do Acais. O texto a seguir traz mais esclarecimentos: Alhandra: a ‘Cidade Jurema’ de identidade indígena Inúmeras eram as manifestações culturais indígenas, entre elas o politeísmo (a fé em vários deuses), fator inaceitável para a mentalidade cristã católica. Talvez tenha sido esse um dos maiores conflitos entre o mundo europeu e o mundo indígena, afinal, para a mentalidade católica da época só haveria salvação pela conversão católica, pelo abandono de hábitos ‘selvagens’ e pela adesão dos bons costumes e princípios dos ditos ‘civilizados’. Só o cristianismo poderia tirar os selvagens de sua situação ‘animalesca’ e dar-lhes uma nova condição, tornando-lhes cristãos, de um estado de selvageria para o de humanidade, pelo menos era isso que ditava o pensamento europeu quinhentista. Mas que um viés econômico, essa questão era perpassada por noções de verdade, realmente acreditava-se num projeto salvacionista. Mas os nativos não abandonaram suas crenças tão facilmente, resistindo à imposição dos europeus. As missões nas aldeias indígenas tinham essa forte, se não principal, preocupação em levar os índios a crer no Cristo e aceitar o evangelho. Os índios ao que parecem inicialmente aceitaram com certo entusiasmo, porém logo: ...se desinteressavam do culto de modo que era preciso levá-los à força. Preferiam ficar nas suas roças e lavouras fora da aldeia onde permanecendo, parece que ficavam desobrigados de freqüentarem a igreja que então só os atraia na época do São João por causa das fogueiras, ou pela quaresma, atraídos pelo ritual da flagelação no qual viam mais uma prova de coragem do que um ato de penitencia daqueles que se submetiam a ela. (MEDEIROS, p. 33)
A tarefa dos missionários não era simples, uma vez que além de catequizar viam um processo de ressignificação de seus rituais pelos índios, fugindo muitas vezes daquilo que era proposto pelos padres. Com o uso da força os índios eram obrigados a participar das missas, porém eram os povos Tabajaras os mais receptivos à cultura européia, assim logo sendo confundidos com os demais da população. Em Alhandra, os problemas dos missionários não pareciam ter sido diferente, as dificuldades de levarem os índios a crerem num só Deus não foi tarefa das mais fáceis. Embora que os povos Tabajaras se mostravam mais receptíveis à cultura européia do que os Potiguares. E isso talvez explique, em partes, que ainda hoje encontremos no território da Paraíba aldeias Potiguares, enquanto os Tabajaras desapareceram sem deixar muitos vestígios, como vemos na aldeia indígena de Alhandra. Contudo, mesmo os Tabajaras sendo um tanto mais afetuosos aos padres (MEDEIROS, 1999), ainda assim não deixaram sua cultura de forma tão pacifica e muitas vezes se tornavam cristãos batizados mantendo seus rituais e costumes. Foi o que aconteceu em Alhandra, que manteve um forte sincretismo religioso. O misticismo religioso que perdurou por muito tempo em Alhandra é uma clara herança indígena. Esse sincretismo é tão forte, que a cidade chegou a ser conhecida com a “Cidade Jurema”, isso porque nos locais de prática dos rituais de catimbó é constante a presença da jurema, caracterizada pelos seus efeitos alucinógenos. Esse é um tema que desperta a atenção de inúmeros estudiosos, chegando a ganhar destaque internacional pela fama de seus poderes sobrenaturais.
Certo dia a cidade acordou com uma novidade, os repórteres da BBC de Londres vieram do outro lado do mar para conhecer Alhandra, todos aqueles equipamentos esquisitos coisas do primeiro mundo e uma língua enrolada para fazer uma reportagem sobre a cidade da jurema, sendo assim Alhandra seria conhecida internacionalmente (...) conseguindo trazer estudiosos de toda a parte do mundo, curiosos com o misticismo do lugar. (SOARES, 1999. P. 55) Alhandra sempre despertou a atenção de muitos, que atraídos pelos famosos mestres da jurema, buscavam a realização de desejos e fantasias. Mais que um local de estudo, Alhandra era um território de misticismo e magia. Jurema (branca) é uma árvore, da qual se faz a bebida de poderes alucinógenos, que por seu efeito era controlada. A perseguição de policiais sob os ‘mestres da jurema’ obrigou que os rituais fossem realizados as escondidas, afastados da cidade, deslocando em espaço e tempo a crença herdada pelos índios. Conta-se que quando morriam não tinham o direito de serem enterrados no cemitério local, sendo sepultados em lugares afastados, onde se plantava um pé de jurema para marcar o local do sepultamento. Nesses mesmos locais eram também sepultados todos aqueles seguidores do mestre da jurema, colaborando no surgimento das chamadas “cidades da jurema”, como: Cidade de Manoel Cadete, Cidade de Rosalina, Cidade de Maria do Acais, Cidade do Mestre Adauto, Cidade do Rei Heron, Cidade dos Encantos (Tambaba) e Cidade de Águas Claras (SOARES, 1999).
A ‘cidade da jurema’ mais conhecida é a do Acaís, um pequeno povoado situado às margens da estrada que leva ao município de Alhandra. A fama dos poderes sobrenaturais e mágicos desse lugar mereceu uma reportagem no jornal, A União de 20 de julho de 1997, que estampava a manchete: “Ciências ocultas em Alhandra: Pacto de silêncio protege a Cidade Sagrada da Jurema”. Esta reportagem, de Machado Bitencourt, ressaltava que a família Guimarães, descendentes da ‘Mestre de jurema’ Maria do Acais, guardam os segredos da preparação das bebidas feitas com a jurema. Para entendermos melhor como era a realização do culto da jurema, vejamos como se dava entre os índios Tuxás:O culto da jurema, tal como se apresenta entre os tuxás, desenrola-se em torno da bebida ou o vinho da jurema, o qual produz alterações na consciência que auxiliam a propiciar o transe. Orlando Sampaio Silva em sua pesquisa encontrou mais do que elementos mágicos europeus ou assimilação do catolicismo, referencias extraídas do espiritismo kardecista e da umbanda. As entidades cultuadas são denominadas de encantados, que são espíritos dos gentios – falantes das línguas nativas – habitantes do reino encantado, que descem para curar e realizar trabalhos para os vivos, também chamados de mestres ou caboquinhos. Cascudo menciona em seu estudo a crença em dois reinos encantados: do Vajucá e do Juremal, sem especificar distinções entre eles.(ANDRADE, 2002. p. 225)A respeito da prática do culto da jurema e do catimbó em Alhandra, destacamos a atuação da Mãe Maria do Acais, que segundo a reportagem da ‘A União’:... Essa respeitável senhora exerceu ofícios de videntes e conselheira de milhares de doentes e portadores de doenças exóticas e não sabidas das ciências médicas. Através dos conselhos de “Mãe Maria do Acais”, das suas preces e evocações, a maioria desses adoentados recuperava a saúde física, a tranqüilidade e o uso pleno das suas faculdades mentais. Nas práticas de “Mãe Maria do Acais” incluía-se a ingestão de um tipo de vinho fabricado com sementes.
Sementes da “Jurema”, planta que crescia e se multiplicava no sitio dos Guimarães, em Acais. Folha, sementes casca e raízes desse vegetal serviam para o preparo de garrafadas licores, chás, banhos e condimentos desenvolvidos em formulas que Maria do Acais manteve em segredo, até sua morte, no ano de 1937... (A União, 20 julho de 1997). A reportagem nos traz a informação do uso do vinho feito da jurema, a mesma referência que Andrade (2002) nos dá a respeito dos índios Tuxás na Bahia, sobre a origem desses poderes sobrenaturais do Acais. Tudo teria começado com a índia Maria Gonçalves de Barro, conhecida por Maria índia, que teria recebido do Imperador Dom Pedro II as terras do Acais, onde teria assentado moradia. Maria Índia teria dado inicio, então, ao uso da jurema para curar os mais variados males. Como não teve filhos, a sua sobrinha, Maria Eugênia Gonçalves Guimarães, recebeu a herança da tia, e logo ficaria famosa como sendo, a ‘mestre’ Maria do Acais. Depois de sua morte, Flósculo Gonçalves Guimarães, seu filho, foi seu continuador, nos demonstrando os laços de parentesco que circundam sob os domínios do segredo da jurema. Existe, assim, um forte sincretismo, que apesar dos traços de um culto indígena no uso da Jurema, também se faz sinais da umbanda, do espiritismo e do catolicismo. A influência católica é, portanto, a mais evidente, uma vez que em Alhandra, em frente à casa dos Guimarães onde viveu e fez seus trabalhos espirituais, Maria do Acais, há uma capelinha dedicada a São José.
Entre os muitos mestres de juremas de Alhandra, cogita-se que um dos mais famosos seja Zé Pelintra, também nascido na Vila. A cidade, assim, figura entre esse lugar cheio de mistérios sobrenaturais. Muitos conhecem a fama de Alhandra e de seus mestres da jurema, mas sua história continua a ser um desafio, uma vez que sobre esse misticismo envolto pela jurema, os que sabem afirmam ser uma herança dos índios Arataguis. A junção dos elementos da religião européia e indígena resultou nessa mistura, fazendo de Alhandra a ‘cidade jurema’ no país do evangelho. A identidade de Alhandra, como sendo a ‘Cidade Jurema’, é então resultado de seu passado indígena, onde mesmo sofrendo inúmeras interdições, aculturações e fortes influências de outras religiões, termina por culminar no traço principal indígena, que é o uso da Jurema. Reconhecer esse passado é também resgatar essa identidade, muitas vezes rejeitada pelos próprios habitantes da cidade, que assumem uma identidade branca e cristã, e renegam (pelo simbolismo negativado que hoje existe) as identidades de indígena e catimbozeiro. De aldeia a primeira vila da Paraíba, Alhandra é um exemplo do passado e da herança indígena não só do povo paraibano, mas do povo brasileiro. A identidade indígena brasileira precisa ser resgatada com maior afinco, para que possamos aos poucos preencher as lacunas da história ou das histórias do Brasil.
Por LUIZ FRANCISCO DA SILVA JÚNIOR & VIVIAN GALDINO DE ANDRADE

2 comentários:

  1. Esse espaço é muito importante para divulgar toda essa história Nós do Quilombo Cultural Malunguinho estamos nessa luta de valorizar de forma colétiva nossa Jurema sagrada, Sempre estamos atentos para tudo que se refira á Jurema e estamos nessa luta há muito tempo inclusive aqui no acais participamos do levante dessa valorização ,Estamos juntos nessa luta á Jurema é nossa e o Acais tambêm "SALVE Á JUREMA SAGRADA"

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  2. como ter o cachimbo de jurema preta? moro em Ribeirão e só encontro de angico

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